5/07/2015

Perfil dos "Verdes" - Cataguases 1927 - (7) MARTINS MENDES



MARTINS MENDES - Antônio Martins Mendes nasceu em 1903, na Fazenda da Pedra Redonda, em Araponga/Ubá MG. Transferiu-se cedo para Cataguases, onde foi estudante no antigo Ginásio de Cataguases e posteriormente professor. Foi advogado e promotor público. Começou seus estudos de Direito em Belo Horizonte, concluindo-o na Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, em 1929. Fez parte do grupo do Movimento Verde. Morreu em 1980, no Rio de Janeiro, para onde se transferira, alguns anos antes, com a família.
Obra: Treze poemas (1929).



meia pataca

Martins Mendes

lá no fundo da cidade,
lá no fim da rua de casas velhas,
entre ingazeiros e canaviais,
rola um ralo rio de águas claras,
rola calmo, preguiçosamente,
que até parece que não rola...

No tempo de Guido Marlière,
o francês que plantou povoações
e morreu num deserto verde,
o rio deu ouro (diz a lenda).
Sua água lustral batizou a povoação:
- MEIA PATACA.

Hoje o Meia-Pataca não dá ouro.

É um riozinho triste, esquecido,
que lembra a gente
que no tempo dos índios,
no tempo da onça,
no tempo de Guido Marlière,
Cataguases se chamou
MEIA PATACA, apenasmente.
(1929)


O jovem Antônio Martins Mendes.



PRECE
(Dedicado ao Dr. Levindo Coelho)

Martins Mendes

Senhor, dá para as minhas mãos vazias,
que se levantam para o Teu céu,
o trabalho que fará o pão para minha fome;
dá, para meus olhos cansados,
um pouco do brilho das estrelas
que a Tua mão de Criador
espalhou pelo Teu céu.

Dá para meu espírito que te sente
mas que Te não compreende,
o sossego dos que estão certos do amanhã.

Dá, Senhor, para o meu coração
a graça dos que creem e esperam,
a resignação dos que confiam em Ti
e a bondade dos que perdoam e esquecem.

Dá, Senhor, dá para mim, a fé que anima aos fracos,
e a esperança que consola aos tristes .

Assim seja, meu Senhor e o meu Deus,
por todos os séculos dos séculos.


Em foto de Iannini.


Em caricatura de Di Carrara.



Evocação

martins mendes

no quarto da austera sala de visitas
da velha Fazenda da Pedra-Redonda
há uma capelinha simples
onde, à noite,
Vovó rezava o terço e as ladainhas.
(Velho costume...)

À hora da reza ela acendia as velas da
Capela
e reunia o pessoal da Fazenda
... e começava o terço e as ladainhas...

Todas as noites Vovó rezava uma Ave-
Maria
pra as almas dos que morreram na Fa
zenda.
(Ela não se esquecia dos mortos)
E pra os netinhos que estudavam
nos colégios da cidade,
e pra os doentes
Vovó rezava uma reza especial.

Era comprida a reza na capelinha da Fa-
zenda!

Os pretos velhos cochilavam no meio da
reza
e, de vez em quando, batiam no peito
com a mão descarnada com que se ben-
ziam,
uma pancada forte
e diziam – AMÉM.

Na capelinha enfeitada com flores de pa-
pel de seda
há velas bentas
que vovó acendia nos dias de tempestade
rezando pra Santa Bárbara e S.Jerônimo.

Hoje ela morreu...
E, à noite, à hora da reza,
entre lágrimas e saudades,
nós nos lembramos de Vovó
com um Padre-Nosso e uma Ave-Maria.

E a reza vai ficando cada vez mais com-
prida
na capelinha da Fazenda!
Mais comprida...
(1929)


Vista da região de Pedra Redonda, onde nasceu o poeta.


Fazenda da Pedra Redonda, onde nasceu Martins Mendes.



a tropa

martins mendes

trotando a trotes largos
pela estrada poeirenta,
a tropa vem de longe,
vem do sertão.

Trauteando uma cantilena3 compassada
o tropeiro cansado, empoeirado,
vem seguindo atento, atento
a tropa que vem de longe.

Passou pela cidade a tropa
envolta numa nuvem de pó amarelo
– como a esconder-se de vergonha
por ser uma cousa velha,
muito antiga,
colonial...

Passou a tropa a passos lentos...

Perdidos no ar, dentro do meu coração,
lembrando o serão distante,
ficou o som forte e triste
da cantilena do tropeiro
– da tropa do sertão...




Capa do livro de Luiz Fernando de Sousa sobre vida e obra de Martins Mendes.


Com a esposa Nair, em seu apartamento no Rio de Janeiro.


Com as filhas Maria do Carmo e Lina.


No dia de lançamento da peça "Carta aos Ases", de Ronaldo Werneck, Joaquim Branco e Mauro Sérgio Silva, homenagem aos 40 anos da revista Verde, em 1967, no Clube Social Cataguases.




o túnel

martins mendes

a boca-de-pedra do morro
engoliu o trem-de-ferro
que vinha rolando nos trilhos,
que vinha rolando...

Quando se acabou a escuridão
dentro do carro,
eu cheguei á janela
e olhei a boca-de-pedra.

Ela soltava baforadas de fumo grosso
como se tivesse tirado uma tragada gos-
tosa
num charuto grande
como um trem-de-ferro.
(1929)


Autografando seu livro no Hotel Cataguases, década de 1960.


Capa do livro de Martins Mendes, 1929.


Ficha de funcionário no Colégio Cataguases.



Fotos cedidas ao meu arquivo pessoal por familiares do poeta, a quem agradeço muito.






2 comentários:

Edmar disse...

Mestre Joaquim, essa fotografia da Fazenda onde nasceu o Mestre Martins Mendes me chamou atenção porque nasci no Vale encantado da Pedra redonda em ubá, MG. O senhor tem Email para que eu possa entrar em contato. Um abraço Edmar.

Joaquim Branco disse...

Sim, Edmar. joaquimb@gmail.com