10/30/2017

CDA - POEMAS DEMOLIDORES



POEMAS DEMOLIDORES

Joaquim Branco

É por demais conhecida a característica dessacralizadora dos primeiros anos do Modernismo brasileiro, quando Oswald de Andrade e seus aliados investiram contra as muralhas de um passado com o qual queriam romper.
Na literatura, particularmente, os poetas utilizaram uma arma tão mortífera quanto eficaz: o humor, temperado pela determinação de ruptura. Às vezes, apenas através de uma ironia reticente, mas, em muitos casos, do riso grotesco, da gargalhada franca ou da simples galhofa.
Tendo como foco a obra de Carlos Drummond de Andrade, vamos nos ocupar de uma fase de sua obra, que, mesmo tendo em vista uma atuação discreta em termos pessoais, contribuiu grandemente para a derrubada de um status quo que acompanhara a virada do século XIX.
No número de estreia da revista Verde, de Cataguases, Drummond comparece e deixa transparecer todo o seu arrojo, praticamente na sua primeira demonstração de que não estava no movimento apenas como figurante:

SINAL DE APITO

Um silvo breve: Atenção, siga.
Dois silvos breves: Pare.
Um silvo breve à noite: Acenda a lanterna.
Um silvo longo: Diminua a marcha.
Um silvo longo e breve: Trânsito impedido em todas as direções.
Três silvos longos: Motoristas a postos.

(A este sinal todos os condutores tomam lugar nos seus veículos
/para movimentá-los imediatamente).
(VERDE nº 1, set.1927, p. 15)

Continua a série de poemas demolidores da velha retórica, com o hoje famoso “Quadrilha”:

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém,
João foi pros Estados Unidos, Teresa foi pro convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou pra tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com Brederodes (1)
que não tinha entrado na história.
(VERDE nº 3, nov./1927, p. 15)

E complementa sua participação na revista com “Convite ao suicídio”, em que se arrisca bem mais na questão temática, expondo-se à ira da tradicional família mineira em longo poema:

Vamos dar o tiro no ouvido,
Vamos?
Largar essa vida
largar esse mundo
com prar o último bilhete
e desembarcar na estação central do Infinito perante a comissão
/importante de arcanjos bem-aventurados profetas – vivôooô!
[...]
Vamos fazer a grande besteira:
rebentar os miolos
e ir receber no céu o castigo de nossos amores
e o prêmio de nossas devassidões.
(VERDE nº 4, dez./1927, p. 16-17)

Os versos anedóticos, poemas-minuto e as blagues extrapoladas de tão variados matizes predominam e nos dão a impressão de que o poeta tem uma metralhadora giratória nas mãos, quando faz crítica à poesia tradicional e ao mesmo tempo desloca o eixo da sobriedade poética, como em:

(...)
Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é o meu coração.
(...) (Ibid., p. 9-10)

A última peça de Alguma poesia, o “Poema da purificação”, não tem o timbre iconoclasta dos demais, como a dizer ao leitor: olhe, eu também faço poesia sem brincadeiras. Em lugar do anjo torto do início do livro surgem as figuras de três anjos – um bom, um mau e um regenerador –, que ajudam o poeta a tentar a redenção do mundo pela poesia:

Depois de tantos combates
o anjo bom matou o anjo mau
e jogou seu corpo no rio.
[...]
Mas uma luz que ninguém soube
dizer de onde tinha vindo
apareceu para clarear o mundo
e outro anjo pensou a ferida
do anjo batalhador.
(Ibid., p. 77)

O humor e a poesia sintética foram as armas mais poderosas utilizadas por Carlos Drummond e seus companheiros de geração naquela hora em que o movimento modernista precisava se firmar, derrubando os clichês e os lugares-comuns de uma poesia ultrapassada. E foi através de Drummond, que demonstrou metalinguisticamente haver um mundo novo a se criar, que pudemos ver como alguns entulhos do conservadorismo foram removidos para a chegada de uma nova era.

BIBLIOGRAFIA
ANDRADE, Carlos Drummond. Fazendeiro do ar & poesia até agora. Rio de Janeiro: José Olympio, 2ª edição, 1955.
VERDE: revista mensal de arte e cultura. Cataguases, n. 1-5, n. 1 da fase 2; 1 n. especial de apresentação e depoimentos. Ed. fac-similar. 1927-1929. São Paulo: Metal Leve, 1978.
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1 Nas versões posteriores deste poema, Drummond alterou o nome 'Brederodes' para 'J. Pinto Fernandes', muito mais insinuante e significativo para as intenções do poeta e para o conjunto do texto.

(Desenho de CDA por Nelson Bravo)

10/18/2017

"VERDE" NO COLÉGIO ESTADUAL CLÓVIS SALGADO


Hoje, 18-10-2017, mantive pela manhã um bate-papo com professores e alunos do Colégio Clóvis Salgado, Cataguases, sobre o "Movimento Verde, a literatura modernista e a cidade de Cataguases". Apreciei o interesse de diretores, professores e alunos na matéria abordada e agradeço a atenção e a boa recepção que me proporcionaram durante a estada lá.






10/12/2017

POEMA PROCESSO - 50 ANOS (1967-2017)


50 ANOS POEMA/PROCESSO: UMA VANGUARDA SEMIOLÓGICA



Foto de Roberto Moriconi da 5ª Exposição do Poema Processo no Rio de Janeiro em 1968, a convite de Arte no Aterro, org. por Frederico Morais.


Após dois anos de pesquisa, a Galeria Superfície tem o prazer de apresentar a exposição 50 anos Poema/Processo: uma vanguarda semiológica. A mostra rememora as primeiras exposições e manifestações artísticas do movimento, iniciadas em dezembro de 1967, simultaneamente em Natal (RN) e Rio de Janeiro (RJ). Nesta ocasião, o grupo lançou seu manifesto e suas proposições, contando com artistas dos estados de Minas Gerais, Bahia, Rio Grande do Norte, Espírito Santo e Pernambuco.
Decorrente do concretismo, o movimento Poema/Processo surge como um rompimento criativo com a comunicação institucionalizada no campo da literatura, da poesia, do cinema e das artes plásticas. Verificou-se primeiro a necessidade de separação entre poema e poesia, tendo a poesia como um conceito abstrato, e o poema como objeto tátil, material, plausível de ser rasgado e manipulado. Depois a concepção de poema foi radicalmente ampliada sendo produzidos pelo grupo poemas-visuais, poemas-objeto, poemas para serem rasgados, poemas para serem queimados, poemas comestíveis, filme-poemas e happening-poema.
A exposição ocorrerá no espaço da Galeria nos Jardins em São Paulo e, simultaneamente, na Biblioteca Mário de Andrade, que recebe obras do movimento como extensão da mostra. Estarão em exibição obras históricas inéditas, produzidas entre o período de 1966 a 1977, de artistas como Wlademir Dias-Pino, Álvaro de Sá, Neide Sá, Décio Pignatari, Falves Silva, Moacy Cirne, Paulo Bruscky, Anchieta Fernandes, Márcio Sampaio, Joaquim Branco, P. J. Ribeiro, Ronaldo Werneck, entre outros.
No mesmo dia será exibido no auditório da Biblioteca, às 18h30, o filme Apocalipopótese - Guerra & Paz(1968), do poeta e documentarista Raymundo Amado, que registrou uma das primeiras exposições do movimento, nas atividades propostas por Frederico Moraes no evento chamado Arte no Aterro, no Aterro do Flamengo, Rio de Janeiro.
(Texto produzido pelos organizadores da mostra em São Paulo)
Serviço
21.10.2017 - 15.12.2017 Horário de visitação - Galeria Superfície: de terça a sexta, das 10h às 19h sábado, das 10h às 17h - Biblioteca Mário de Andrade:(Rua da Consolação, 94 - Consolação)de segunda a sexta, das 08h às 22h sábado e domingo, das 08h às 20h




"Manhattan", poema processo de Ronaldo Werneck




"Voguerrilha", de Sebastião Carvalho





Aquiles e Joaquim Branco, Ronaldo Werneck, P.J.Ribeiro e Sebastião Carvalho participam da expô dos 50 anos do Poema Processo (outubro 2017)




JB e P.J.Ribeiro



Ronaldo e JB


O grupo Totem nos idos de 1970: 1-Ronaldo, 2-Pedro, 3-Adolfo, 4-Joaquim, 5-Aquiles, 6-Sebastião, 7-Plínio e 8-Meu carro


JB e PJ Ribeiro com Wlademir Dias Pino, nos anos 1970






O grupo totem com Chico Peixoto, no seu aniversário de 70 anos.





10/08/2017

LANÇAMENTO DOS LIVROS "REFUGIADOS" E "SOB O SIGNO DO IMPREVISTO" - 09-09-2017

Fotos da noite de lançamento dos livros "Refugiados", de Joaquim Branco, e "Sob o signo do imprevisto", de Ronaldo Werneck, dia 9 de setembro de 2017: