11/22/2016

VISAGENS - Rio de Janeiro - 2016


VISAGENS

O Sarau Fio MultiCultural apresenta a exposição coletiva e internacional de Poesia Visual “Visagens”, com obras de 46 artistas de 16 países, com curadoria assinada por Tchello d’Barros.

Sobre a exposição Visagens
“Visagens” é um projeto iniciado em 2013 com a finalidade de difundir a Poesia Visual e vem se desdobrando em exposições itinerantes, mesas-redondas, produção textual teórica, palestras e projeções de imagens em diversos eventos e instituições. São obras de 46 autores de 16 países que apresentam suas criações sob o tema universal da Paz.




Serviço
Quê: Exposição internacional de Poesia Visual “Visagens”
Quando: Abertura em 22.nov. 2016 - Terça-feira as 17 h
Onde: Fórum de Arte e Cultura da UFRJ - Av. Rui Barbosa, 762 - Flamengo, Rio de Janeiro, RJ
Visitação: Segunda a sexta-feira das 09 as 17 h até 09.dez.2016
Quanto: Entrada Franca
Curadoria: Tchello d’Barros
Coordenação do Sarau FioMulticultural: Clécia Oliveira
Evento no Facebook: https://www.facebook.com/events/880938015406813/
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Contato
Tchello d’Barros
(21) (21) 9 8354.1978 Tim
tchellodbarros@gmail.com


11/12/2016

CENTENÁRIO DO POETA ASCANIO LOPES 1906-2006


Registro das comemorações realizadas no ano de 2006, em Cataguases MG, por ocasião do Centenário do poeta Ascanio Lopes, com organização do Departamento de Letras da FIC em conjunto com a Prefeitura Municipal de Cataguases e o Instituto Francisca de Souza Peixoto. Houve um sarau com poemas de Ascanio, lançamento dos livros Verdes vozes modernistas e Ascanio Lopes no fio da navalha, discursos, música.



COMEMORAÇÕES DO CENTENÁRIO DO POETA ASCÂNIO LOPES - 2006

1. Abertura geral - Flávia Massena.
2. Palavra do Prefeito
3. Palavra do Secretário de Cultura e Turismo
4. Flávia apresenta o Sarau do grupo da FIC
5. Carol apresenta a teatralização do sarau sobre Ascânio Lopes
6. Encenação do sarau “Ascânio Lopes no fio da navalha”
7. Carol apresenta as músicas de Giovani e Edjaine
8. As músicas, por Giovani e Edjaine
9. Flávia dá início ao lançamento com os autógrafos e o coquetel
10. O lançamento

APRESENTAÇÃO DO SARAU - 11 de maio de 1906 - dia em que nasceu o poeta Ascânio Lopes.
Hoje, 11 de maio de 2006 - dia em que comemoramos os 100 anos de um jovem que morreu aos 22 anos e se tornou o maior poeta de Cataguases.
Portanto é uma honra para todos nós saudar esse dia em que uma luz maior se fez em nossa cidade e se projetou logo intensamente.

O sarau que vamos apresentar agora é um recorte de poemas de Ascânio Lopes, colocados numa sequência temática, em que foram agrupados os trabalhos. Este grupo de alunos do 5º Período de Letras pertence às Faculdades Integradas de Cataguases, a cujos diretores agradecemos o empenho para esta apresentação. As músicas de ligação foram selecionadas e montadas por Sonia Regina Tinoco. Design gráfico: Natália Tinoco. Concepção e direção: professor Joaquim Branco. Como convidada especial tivemos a presença ilustre da sobrinha do poeta Regina Quatorzevoltas.

Promoção do evento: Prefeitura Municipal de Cataguases.
Organização: Secretaria Municipal de Cultura e Turismo, com a colaboração da Secretaria de Infra-Estrutura e Secretaria de Educação.
Local das comemorações: Centro Cultural Eva Nil.
Data e horário: 11 de maio de 2006, a partir de 20 horas.
Agradecimentos: Departamento de Letras das Faculdades Integradas de Cataguases FIC e Instituto Francisca de Souza Peixoto.

Sequência dos eventos:

- Encenação do sarau “Ascânio Lopes no fio da navalha”, por alunos do Curso de Letras das Faculdades Integradas de Cataguases - FIC.
- Apresentação de músicas com letras de Ascânio Lopes e composição musical de Giovani, na voz de Edjaine, alunos da FIC.
- Exposição de cartazes com a história do Movimento Verde.
- Coquetel de lançamento do livro Ascânio Lopes no fio da navalha, de Joaquim Branco.






Capa e contracapa de Natália Tinoco a partir de desenhos de Zeluca e de Slotti.







Discurso do prefeito Tarcísio Henriques:

O Centenário de Ascânio Lopes

“A luz do lampião ficou fraca e havia muito mais sombras pelas paredes e dentro de nós uma sombra infinitamente maior”(“Serão de menino pobre”)

Nunca ficou suficientemente esclarecido como é que se juntou um dia um grupo de rapazes de 18 e 20 anos com uma ideia de reformular a literatura, e tendo uma repercussão tão grande que conquistou o apoio de São Paulo, alcançou o Brasil inteiro e até hoje é um ponto de referência de protesto intelectual que obteve foros de revolução, com propostas até agora aproveitadas como base para retomada do nosso renascimento provinciano.
As incipientes forças produtoras ainda estavam ressentidas da Abolição, as estruturas políticas engatinhavam nos primeiros anos republicanos, quando começaram a surgir as primeiras insatisfações sociais, retratadas nas inquietações refletidas na Revolta Tenentista de 22, no manifesto modernista de São Paulo, enquanto o Movimento de Cataguases interpretado por Guilhermino César foi “um movimento, à semelhança do que sucedeu por igual, em outros lugares, na mesma ocasião, prenunciando 30, fomentando inquietações que iriam desembocar num largo estuário literário e político.”
As manifestações artísticas sempre foram formas e meios utilizados pelas elites intelectuais para mostrar os enganos cometidos pelos governantes. Se a elas não apeteciam ser governo, como queria Platão, podem e devem influenciar, chamando a atenção para caminhos melhores. Desde o teatro grego, há mais de dois mil anos, tem sido assim, como no mesmo tom têm sido a poesia, a música, a escultura, a pintura, abrindo os olhos entre abertos, ou mesmo fechados, de muitos homens.
Lembrar Ascânio Lopes, no centenário de seu nascimento, além de evocar seus companheiros e os seus propósitos na Revista Verde, mas também refletir sobre sua vida sofrida de um jovem saído do meio rural, órfão em tenra idade, trazido para a cidade para se criado por parentes longínquos. No Ginásio de Cataguases aproximou-se de um grupo irrequieto, disposto a “mudar o mundo” Poeta, essencialmente poeta, pôs em versos sua amargura, mas também sua esperança, o que o sensibiliza quantos o leram e ainda o lêem. Morreu cedo, ainda sem completar os 23 anos, mas com o pouco que deixou foi comparado a Carlos Drumond de Andrade, que um dia se encontrou com ele, na rua da Bahia e “fiquei gostando dele em quem enxergava uma alma finamente colorida, meiga, séria e encharcada de poesia. Não pretendo entender de almas, julgo porém ter encontrado desde primeiro dia a chave desta, que nunca cheguei a abrir, mas fui um de seus amigos mais certos”.
Lembrar Ascânio é falar de seus companheiros, das ideias jovens que queriam romper com o obscurantismo de então. Foi tão querido pelos companheiros e foi tão sentida sua partida, que, com sua morte, morreu também a veiculação da Revista que circulou apenas mais uma vez, somente para homenagear o poeta que tombara. Sua morte abalou seus companheiros da Revista, e o Dr. Francisco, Rosário Fusco, Guilhermino César, Enrique de Resende, foram unânimes no registro de que a Revista não teve razão de continuar sem Ascânio.
Delson Gonçalves Ferreira e Luiz Rufato, em excelentes trabalhos escreveram livros que merecem ser consultados, lidos e relidos, porque tratam de Ascânio, com proficiência.
Márcia Carrano, minha candidata para o sonho da junção da Secretaria da Cultura com Educação, num determinado momento deixou para nossa reflexão:
“Agora, se quisermos analisar a sua importância para Cataguases, a história fica mais longa e os frutos mais copiosos, pois tudo o que se fez e se tem feito culturalmente aqui é resultado da “Verde” que amadurece e volta a se enverdecer cada nova geração”.
Parabéns a quantos se lembraram desta homenagem, aos quais rendo meus agradecimentos, com um registro especial para Joaquim Branco e para Lourdinha Paixão.
















11/09/2016

GUERRA E PAZ


Joaquim Branco


Hoje (7/11/2016), na Inglaterra, no Canadá e em alguns outros países, é o Dia do Ressurgimento no qual se comemora o término das grandes guerras na Europa. Como simbologia para o evento, tanto homens quanto mulheres usam papoulas na lapela.
Republico aqui "Um canto na noite", de Henrique Silveira (1919-1943), poeta que viveu em Cataguases no século passado, e sobre o qual faço algumas considerações críticas, Observem como as papoulas (ou papoilas) fazem parte sugestiva do poema para montar o "ambiente" que Silveira tão bem descreveu:


UM CANTO NA NOITE
Henrique Silveira

Um canto chegou
lá de onde floresciam as papoilas...
Chegou com a noite, mas não é da noite.
Veio dos campos de luta molhados de sangue,
veio do chão pisado de máquinas.
Veio das crateras e passou pelos corpos inertes.
Saiu de dentro das trincheiras de ninguém
e rompeu o silêncio,
o silêncio que estava perto de tudo
em toda extensão.
Chegou um canto como de pássaros chumbados.
Chegou flocado de vozes,
de vozes perdidas e de vozes lívidas
e de vozes à procura de Deus.
Quem ouve comigo este canto na noite!?

O poeta Henrique Ignacio da Silveira (1919-1943) viveu sua aventura literária na década de 1930 e início de 40, em Cataguases, no entreato do finalzinho do Modernismo, tendo produzido um tipo de trabalho mesclado de poemas curtos e introspectivos.
Um solitário, sem grandes ousadias, construiu pequena obra que está sintetizada no livro "Poemas desta guerra", publicado pós-morte em 1979, numa antologia selecionada e organizada por mim, após uma pesquisa em que suprimi apenas poucas peças.
Suas temáticas circulam ora pelo alto grau de subjetivismo, ora pela interferência nas coisas do mundo como as guerras, as doenças e os amores.
O poema "Um canto na noite", por si só, nos dá a dimensão deste autor cataguasense cujo senso poético-musical é reforçado por sua capacidade de criação e de domínio do texto literário.
O tema da II Guerra Mundial, que se passava justamente no auge do amadurecimento do poeta (final da década de 1930), é abordado aqui com uma força e uma singeleza pouco comuns.
Em todo o texto, o poeta entoa um canto seu, mas que vem de terras distantes: de onde nascem as "papoilas", de campos "molhados de sangue", e "pisado de máquinas", e fala de trincheiras e do silêncio mortal dos "corpos inertes". Verso a verso, ele parece ensaiar um canto para o leitor chegar a esse tempo (que é o seu) e a esse lugar distante (e próximo) de nós, para que se mostre – como ele – solidário a tanto sofrimento – o das guerras.
Percebem-se, na penúltima estrofe, as metáforas carregadas do peso e da sombra da guerra: o canto de "pássaros chumbados", "flocado de vozes", apertado logo em seguida pelos "iis" de "vozes perdidas e de vozes lívidas" que afinam o discurso poético para, em seguida, abrir e se multiplicar nas vozes "à procura de Deus".
Sua sensibilidade poética pode ser reconhecida na dicção perfeita propiciada pela escolha das palavras, tocadas por um ritmo que vai num crescendo e termina com um estranho lamento, como a buscar na interrogativa final a cumplicidade do Outro.

(Henrique Silveira em desenho de Iannini, 1943)

11/06/2016

A AGRESSÃO FICCIONAL


Joaquim Branco





Em 1943, a Editora José Olympio publicou o romance "O Agressor", de Rosário Fusco, com sugestiva capa de Santa Rosa.

Nesses 33 anos, entre a 1ª edição e a 2ª (de 1976), pela Francisco Alves, Rosário Fusco escreveu outros livros, tornou-se um viramundo. Esteve na França várias vezes, e mais tarde se aposentou como procurador do antigo Estado da Guanabara, não sem antes rechear sua biografia com mil peripécias, para pousar enfim em Cataguases, onde continuou a escrever romances, alguns ainda inéditos.

"O Agressor" foi também publicado na Itália pela Mondadori, em 1968. No ano 2000, seu filho François reeditou a obra pela editora Bluhm.
E seu autor, de temperamento e atividade intensos, permanece até hoje mais como um nome para os outros escritores que o admiravam e admiram sua obra.
"Nunca consegui editar um livro em moldes comerciais", disse ele a mim certa vez, e, consequentemente, também não teve uma resposta popular, permanecendo infelizmente quase desconhecido tanto do público como um todo, como do meio universitário.

Recentemente, o contista Adrino Aragão chamou atenção para as características de "O Agressor" como um romance de esfera kafkiana, alinhando seu autor entre os precursores do realismo fantástico não só no Brasil, mas também internacionalmente, já que as primeiras obras desse movimento são da mesma época.

Tal como em romances classificados no gênero de "estranhamento", David – a figura central de "O Agressor" – é um homem comum, no caso um guarda-livros que trabalha no escritório de uma chapelaria numa grande cidade. Sua existência rotineira, de repente, começa a ser modificada por acontecimentos comuns que, no entanto, o atingem de maneira única e estranha. Só a ele. Como se as coisas, ao se aproximar dele, perdessem o contorno do normal, apresentando sempre consequências negativas e agigantadas.
Já no 1º capítulo, na apresentação de David, pode-se ler: “Nunca recebera uma visita, nem mesmo quando esteve acamado por uns dias, há tempos.” (p. 12) E mais adiante: “Voltando à noite, raramente via os pensionistas, que em geral se recolhiam cedo.” (p. 12)

David chega a confessar, diante das incríveis pressões que vinha sofrendo: “(...) eu lhes juro preliminarmente que não tenho a menor culpa do que está ocorrendo. Não sei de que lado está o direito (...)” (p. 20)
No capítulo final, antes do surpreendente desfecho, mais uma vez o personagem volta à carga, na sua defesa: “– Mas ninguém sabe de nada... Eu não fiz nada...” (p.171)

No capítulo 5 - "Entendimento com Nicolau" - o narrador acentua a atmosfera de mistério e repentinamente registra, como a prenunciar certas investigações que, em tempos de regimes autoritários, surgem: "Nada de especial podia dar corpo às suspeitas de David. Porém, como a falta de indícios também podia ser considerada indício [grifo do autor], suas atividades na casa passaram a ser de pura reserva. [...] Agora, de vez em quando recebia telefonemas." (p. 51)

Entre agredidos e agressores, vale re'viver o universo fusqueano, que precisa ser mais bem conhecido do nosso público, ávido de livros fabulosos como esse "O Agressor". Bem Rosário Fusco.

Bibliografia: FUSCO, Rosário. O agressor. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves Editora, 1976.

Nota: entre as 3 edições de "O Agressor", optei aqui por reproduzir a capa da 1ª edição, desenhada pelo grande pintor Santa Rosa, que retrata muito bem o universo do romance e que me parece de melhor qualidade.

11/05/2016

LANTERNAS ALÉM DO JARDIM




LANTERNAS ALÉM DO JARDIM

Joaquim Branco

Uma vertente para a qual os poetas e ficcionistas sempre se inclinaram é a chamada linha da reflexão e da memória. E trata-se, modernamente, de uma tendência que reúne muitas produções tanto entre criadores quanto em teóricos da literatura.

Se se falar em termos cataguasenses, pode-se remontar, na década de 1920, a Ascânio Lopes – autor de “Cataguases”, que ao enaltecer ‘a mais mineira cidade de Minas Gerais’, transformou o poema na nossa primeira reminiscência literária digna de nota –, ou a Guilhermino Cesar, Francisco Inácio, Enrique de Resende e Martins Mendes, que não permitiram que jamais se esquecesse o córrego Meia-Pataca e a vida da cidade naquele tempo.

Na mesma trilha temática, Francisco Marcelo Cabral manteve a tradição com o seu "Inexílio" – o melhor livro escrito sobre a cidade –, ou Ronaldo Werneck, com seu discurso-corredeira sobre o Rio Pomba.

Agora, reporto-me a algo que os leitores também não poderiam deixar de conhecer: o poema “Carta de Cataguases”, de Lina Tâmega Peixoto, uma homenagem a sua mãe e – por que não dizer? – a Cataguases. Sobre o texto e sua autora, eu teria muito que dizer, mas, diante das poucas linhas que me restam e do que isso adiaria de prazer ao leitor, prefiro ouvir em silêncio a comovedora reflexão propiciada por esses versos.

CARTA DE CATAGUASES
Lina Tâmega Peixoto

Nada afasta o atordoado e leso dia
em que senti se apagarem as margens do mundo
onde cavas as águas do sonho.
Nada redime as formas de amor
e feições de encantamento, transcritas
por muitos anos em teu amargo e doce silêncio.
Eu estava lá e não soube arrancar de teus ombros
o manto de montanhas que tolhia
tua esperança, graça e brilho
com que reordenavas as coisas
da natural existência.
Agora, em penitência e dádiva, desejo tua morte diferente
atenta à glória e levantada do pranto
buscando-te para um passeio em tua casa.
Aflora o coração nos vasos de flores e orquídeas
concebidas como lanternas de jardim
e toma posse do que está aquecido
sob o chão duro do quintal.

Estás tão próxima, submersa no poço da insônia,
que louvo tua miragem e a cerco de filhos
que acariciam teu cabelo e o enrolam
como botões de rosa.
Vejo-te sentada na cadeira da varanda
espalhando no colo meadas de cores
e conduzindo com a mão o rebanho de linhas
para cintilar na toalha sinos de Natal.

Peço que lembres do que construí
camuflada no caos da infância.
Enclausurada nas palavras
deixei-as emendadas na garganta
e fiapos de voz, canto crepuscular,
ficaram à deriva das constelações do medo.

Deposito em teus ossos
– reino de herança ao abrigo da terra –
o óleo suave e espesso da lembrança
que ultrapassa a viagem circunscrita
a nascimentos e mortes.
E recorto na envelhecida porta da memória
as festas de aniversário,
a de borboletas de papel, pregadas nas árvores,
que apanhávamos com redes de filó
e a dos balões crepitando com iscas de fogo
na negrura do céu.
Os rumores de outrora renovam,
como armadilhas de sol,
a compassiva alegria no teu rosto.
Amarguro a perda dos signos do passado
que, indistinto, reconstruo com visitas à tua cidade
e com linguagens de lastro e palha
que contam à tua gente
como salvar-me da solidão.
Não me inclinei sobre tua imagem insulada no tempo
para juntas deitarmos sobre a pedra,
– adamantina pedra da pele e das fraturas do corpo –
que se aquieta em mim
a luz frouxa da meia lua
desfazendo as dobras de nossa história.

Procuro falas da tua vida
na seiva solar que escreve
teu infindo repouso
que arremesso às imprecisas raízes maternas.
Tanto mistério me consola e de tal modo
ordena o emaranhado da alma
que não percebo que lateja nos olhos
a mansa demência da tua morte, mãe.

(foto: Natália Tinoco)