4/18/2015

CONFISSÕES DE UM BLOG



SOB O CÉU DO CAZAQUISTÃO

Meu blog hoje se confundiu comigo e amanheceu estranho. As teclas não aceitam a pressão dos dedos, a tela do computador nada registra. A vontade de escrever não bate com as ideias que teimam em aparecer, ora forçando uma saída de emergência, ou apenas permanecendo quieta.

Isso significa também a preguiça de ler os jornais do dia com as mesmas notícias e apenas a data diferente: conflitos no mundo – Oriente Médio, Europa etc. – assaltos, assassinatos na América.

Um blog sisudo, chato não suportaria uma possível alegria reinante, da mesma maneira que um blog brincalhão e irreverente não veria com bons olhos a miséria no globo. Globb...glubb.

Fugir para alguma ilha no Pacífico era uma antiga opção: mas os anos 50 já se foram, o sonho americano...Marilyn, Bond, Brando. Nada tão pacífico a fazer como esconder experiências atômicas ou espiões entre aborígenes, o que arrebataria o corpo e a mente para novas aventuras.

Ademais, o mapa-mundi colorido e difícil de se percorrer está no museu da memória, enquanto aviões cruzam os céus como a precipitação de uma ideia. O simples ou o rico empresário em busca de negócios – como fazia o poeta com sua imaginação –, toma café no Cairo, almoça nas Ilhas Fiji e pode dormir sob o céu estrelado do Cazaquistão.

A experiência com um blog pode não ser tão decepcionante como outra qualquer. É preciso, no entanto, ativá-lo para ver. E crer que funcionará, apesar de tudo.

Acabou a Guerra Fria e, segundo os teóricos, estamos em plena Paz Quente. Busca-se aprender a lição do Vietnã e retirar as tropas do Iraque e do Afeganistão o quanto antes. Obama dá tempo ao tempo que já perdeu e resolve que sim. Castro está calmo e sereno. O Caribe não é mais um caldeirão prestes e explodir. Não há desculpas.

Meu blog registra tudo com a precisão do instante: o monge budista não põe fogo às vestes para protestar, mas Lady Gaga dança quase nua para uma plateia muda na janela do Youtube. Voltam os protestos contra o racismo em Norte América, todos vão à guerra como fossem a um passeio no shopping. Não sabem que os que não morrerem poderão voltar sem orelha, com um tampão no olho, ou faltando uma perna, e a mente, em colisão completa com o real. Na volta, se tornarão atiradores sem razão e sem culpa que matam crianças nas escolas ou nos cinemas.

O planeta mergulha no petróleo que o homem mesmo extraiu e que não para de emergir, atingindo praias, aves, peixes. As águas são insuficientes para contê-lo, mas são imensas para derrubar barrancos e casas, sonhos e vidas.
Então, o que fazer?

Pode-se fugir para o Atlântico Sul e descansar a vista ao vento com bananeiras à distância, barcos à vela singrando o azul brilhante e um sol que se descola do postal e promete florescer numa terra rica de prazeres e promessas.

Os dedos estão prontos para apertar as teclas. O blog vai responder, responde, prepara a mensagem, volta atrás, deleta, reage, promete dizer tudo, trazer soluções, apontar caminhos. Saem as primeiras palavras: Blog. Glob. Gllubb.

(publicado no jornal "Cataguases")

Um comentário:

Maria Antônia disse...

Ótimo texto para reflexão. Aonde vamos parar?