2/11/2012

JOYCE PARA PRINCIPIANTES

Parece estranho associar a obra do maior escritor irlandês do século XX – James Joyce (1882-1941) – a uma leitura mais acessível ao grande público. Mas, podem crer, isso acaba de acontecer para o leitor brasileiro com a republicação de Ulisses, devido à boa tradução de Bernardina da Silveira Pinheiro.

Considerado por muitos críticos como obra máxima da modernidade, o romance Ulisses há anos intriga os leitores pela impermeabilidade de seu texto complexo, cheio de armadilhas e códigos cifrados, de collages e cortes abruptos, de associações rápidas e inusitadas e de um fraseado multilíngüe.

Sua primeira tradução no Brasil, feita pelo filólogo Antônio Houaiss em 1966, só fez aumentar sua fama de livro difícil, cuja arquitetura permanecia dificultosa para o leitor comum.

O trabalho da professora Bernardina, porém, trouxe uma surpreendente fluência para o texto joyceano, além de uma simplicidade que reedita o Joyce bandalho e anedótico que todos nós gostaríamos de ler e que ficou elíptico no eruditismo e em pequenas diferenças em relação à primeira tradução.

A revista Veja, em comentário do resenhista Jerônimo Teixeira, coteja alguns fragmentos das duas traduções, das quais transcrevemos um em que Houaiss não percebeu a esperteza do expediente utilizado pela personagem Milly, filha do protagonista Leopold Bloom. Vejam como a mesma frase ganha outra conotação nas mãos da professora Bernardina:
“O dia em que a peguei na rua pintando as faces para fazê-las coradas.” (A. Houaiss)

“O dia em que a peguei beliscando as bochechas para torná-las vermelhas.” (Bernardina)
Há fragmentos em que um realismo duro – tipicamente joyceano – se sobrepõe até à escrita cortada e pontilhada de enigmas:
“– Você conhece aquela moça ruiva, a Lily Carlisle?

– Conheço.

– Estava aos beijos com ele na noite passada no quebra-mar. O pai é podre de rico.

– Ela está de barriga?

– É melhor perguntar ao Seymour.

– Seymour um maldito oficial! – disse Mulligan.

Ele acenou com a cabeça em sinal de assentimento enquanto tirava a calça e se levantava, dizendo corriqueiramente:

– As ruivas copulam como cabras.” (p. 24)
Criado – a partir do título – com um elo com a Odisseia de Homero, Ulisses é uma trama moderna em que um trio de personagens (Leopold e Molly Bloom e Stephen Dedalus) se move tendo como pano de fundo a cidade de Dublin, na Irlanda, em apenas um dia (16 de junho de 1904) na vida deles. Posteriormente, este dia ficou consagrado como o "Bloomsday" (Dia de Bloom), que hoje é comemorado com festejos em todo o mundo literário.

Habilitem-se, pois, leitores. Chegou a sua vez de conhecer a obra mais desafiadora do século que passou, escrita com a marca do talento inconfundível de James Joyce.

(JOYCE, James. Ulisses. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 888 pp.)









2 comentários:

Anônimo disse...

Pelos poucos tópicos relatados, acho que vou gostar de "Ulisses". Já está na minha lista de futuras leituras.
Obrigada pela dica, Joaquim.

figbatera disse...

Quincas, vc conhece o trabalho da
Noga Sklar? (escritora e cronista nascida em Tibérias, Israel, em 1952. Graduou-se como arquiteta no Rio de Janeiro e desde 2000 dedica-se à literatura)
Ela tb escreveu sobre o Ulisses de Joyce.