Conheci os primeiros trabalhos de Fernando Fiorese nos anos 80, ele como participante do grupo D’Lira, de Juiz de Fora. Daí em diante, foi construindo sua obra em prosa e verso ao mesmo tempo que se tornou professor na área de Letras da Universidade Federal de Juiz de Fora.
Bem mais tarde, em 2006 Fernando
participou da minha banca de doutorado na UERJ – Universidade do Estado do Rio
de Janeiro.
Foi curto e distante o
contato que tivemos, mas o acompanhamento de sua obra sempre esteve mais
próximo e mais agora que acabo de ler o seu “Romance dos desenganados do ouro &
outras prosas” (Rio de Janeiro: Faria e Silva, 2024, 151 pp.).
Escrito em versos, ora
seguindo um metro ora outro, mas sem perder o fio da meada, este romance-poesia
nos conta a história da Zona da Mata Mineira – “de língua dura e destravada”,
ou “na letra corrida da espingarda” –, da segunda metade do século XIX.
Na busca do ouro que não
existia, “no miserê dos lares”, nos “quiprocós que davam em riso”, nas “pendengas
dos dares e tomares”, Fiorese vai construindo uma identidade quase perdida nessas
Geraes de nossos antepassados.
Há mesmo em toda essa
aventura um fio condutor – o jeito, o modo de vida, os costumes de um povo por
onde vai passando seu texto algumas vezes mais participante como neste pequeno
capítulo em prosa de “Na Livraria Pereira” (p. 104): “E não são os teares e
outras máquinas que escravizam o trabalhador, e sim os capitalistas que se
assenhoram das obras dos gênios das Ciências Mecânicas, cujos espíritos tratam
de mover e mudar a matéria”. (p. 104-105)
No poema “Totonho Furtado”,
vêm enrolados religião, conversa de botequim, brigas de família, para terminar
em referência bíblica temperada pelo humor: “Tem cabimento não, tanto escarcéu/
só fiz achar o mote, afinal/ foi tal e qual: QUINZIM MATOU ABEL.” (p. 89)
Em nossos ‘Sertões proibidos’,
convivem os ditos populares “aquilo que não se tem, faz-se” como a vida do
bandido Antônio que “ganhou fama por pegar qualquer serviço (de menos matar criança,
moça e padre)”. Mas o texto poético e crítico também aí comparece: “Dias e
noites no mesmo e igual cilício/ de derrubar mata e domar cavalo,/ de caçar
pretos e mais tantos bichos.” (p 7)
Fiorese vai traduzindo e
poetizando todo o material narrado numa impressionante sucessão de fatos onde “Muita
vez é maior verdade a lenda” (p. 11). Como no caso do Capitão Amaral que não
queria o casamento da filha com um pretendente desconhecido na região. “Por
ele, antes a filha sem marido/ que emprestar o sangue àquele sicrano,/ de quem
não tinha as modas nem o molde./ Entanto, Laura cismou que era Antônio/ ou se
atirava no Pomba a doidivanas.” (p. 10)