(Capa Edna A.W.Gabriel, a partir de xilogravuras de José Francisco Borges)(imagem da capa divulgação)
A literatura de cordel é um gênero popular que conta, em versos, estórias de batalhas, crimes, amores, eventos políticos e sociais, nacionais ou mundiais. Também narra desafios entre cantadores.
Esse tipo de poesia surgiu em Portugal no século XIX, criada e lida por gente da classe média (advogados, professores, militares, padres, médicos, funcionários públicos). Eram livros impressos em papel barato, a preços módicos e pendurados em barbante (daí o nome cordel).
Incluía autos, farsas, contos fantásticos, moralizantes, peças teatrais, hagiografias e aparecia em forma de poesia (verso) ou teatro. Esses livros eram adquiridos por pessoas letradas e lidos para pessoas não-letradas.
No Brasil, a princípio receberam o nome de folhetos, impressos em tipografias, mas depois passaram a ser produzidos em tipografias do próprio poeta (sistema mais prático e econômico) e ganharam a denominação de Cordel.
Entre os iniciadores no Brasil estão Leandro Gomes de Barros (Branca de neve e o soldado guerreiro, Juazeiro, 1978) (Vida e testamento de Cancao de Fogo; S.Paulo, Luzeiro, s.d.) (Peleja de Manoel Riachão com o diabo; S.Paulo, Luzeiro, s.d.), em 1893, e Francisco das Chagas Batista (1902). O período áureo da literatura de cordel foi até os anos de 1920.
A venda dos folhetos era feita pelo Correio ou nas ruas; mais tarde é que passaram aos mercados públicos e comercializados pelos próprios autores ou por agentes revendedores.
Na década de 20 estabeleceram-se as características do cordel:
• 8 a 16 páginas, para as pelejas (ou desafios) e folhetos de circunstância;
• 24 a 56 páginas, para os chamados romances.
Nas suas histórias, ainda que alguns nomes e situações lembrem outras terras – ao falar de príncipes, reis e princesas – a ambientação mostra fazendeiros, peões e moças do sertão nordestino, com nomes e características próprias.
Algumas histórias contêm o mote, tema em forma de verso que é apresentado a um cantador durante uma disputa com outro.
Há também os folhetos de circunstância ou de época, que narram acontecimentos políticos e assombrações; os ABCs – poemas narrativos com as letras do alfabeto; e os romances, as chamadas ´histórias de antigamente´, sem data fixada.
Muitas dessas e outras informações estão em Cordel na sala de aula, de Hélder Pinheiro e Ana Cristina Marinho Lúcio, editado como livro de bolso pela Livraria Duas Cidades. A obra faz parte da coleção Literatura e Ensino e vem cobrir uma lacuna num setor em que as publicações são raras e as informações também.
10/22/2012
10/10/2012
AFFONSO ÁVILA E O SENTIMENTO DO MUNDO
Hoje recebi a notícia do falecimento do maior poeta mineiro da atualidade: Affonso Ávila.
Um tímido, um esquivo que “nunca adulou a Dona Glorinha”, como diria o nosso Rosário Fusco, e talvez por isso jamais se alçou a alturas midiáticas, como se faz hoje habitualmente.
Em 2005, quando ele completava 80 anos, a UFMG, talvez numa tardia homenagem, editou sua obra completa com o título de Homem ao termo (poesia reunida 1949-2005).
São 56 anos de produção intelectual constante, a deste raro mineiro que raramente saía de Minas. A bela edição da UFMG tem introdução de Benedito Nunes e uma carta-posfácio de Antonio Candido, dois pesos-pesados da teoria e da crítica literária.
O volume se inicia com "O açude" e se encerra com "Mínimo", entre os quais se desenrola extensa lista de livros memoráveis como Carta do solo, Código Nacional de Trânsito, Cantaria barroca, para citar os de minha preferência maior.
A atividade de Affonso Ávila engloba também a de pesquisador, ensaísta e profundo conhecedor do Barroco, mas é na poesia que mais se distinguiu o nosso autor, tendo construído uma obra que começa com sonetos bem realizados e encontra seu território na permanente experimentação com a linguagem.
Pelo conjunto da obra, poderia ser considerado um dos maiores poetas brasileiros contemporâneos (ao lado de Augusto de Campos, Wlademir Dias Pino e Ferreira Gullar), no entanto, para usar as palavras de outro mineiro (Carlos Drummond), Affonso Ávila sempre teve a “cabeça baixa”, e, por outro lado, um posicionamento crítico em que ressaltam o equilíbrio e o “sentimento do mundo” que os só grandes poetas têm.
Para os nossos leitores, apenas um flash poético de Cantaria barroca:
BECO DO ESCORREGA
& a gente pensa que está subindo
& está é descendo
& a gente pensa que está sabendo
& está é descrendo
& a gente pensa que está somando
& está é diminuindo
& a gente pensa que está salvando
& está é destruindo
10/07/2012
NOS PORÕES DA MENTE
Considerado um dos mais importantes autores da literatura russa no século XIX, Dostoiévski, atormentado pelo pai despótico na infância e mais tarde pela epilepsia, produziu intensa obra ficcional.
O jovem Dostoiévski, nascido em Moscou em 1821, chegou a enfrentar a prisão e o degredo na Sibéria por ter participado em 1849 de um levante contra o czar Nicolau I. Lá casou-se com Maria Dinitrievna e escreveria o seu primeiro clásssico: Recordações da casa dos mortos.
Dez anos após, de volta a São Petersburgo e com novas ideias políticas, dedicou-se ao jornalismo e publicou Crime e castigo – sua mais célebre novela – e Noites brancas.
Apesar da venda dos livros, endividou-se com a doença da mulher, a quem abandonou para seguir para o exterior com a estudante Polina Súslova. Consegue trabalho na França, e gasta o dinheiro no jogo. Com remorsos pela sorte da esposa, deixa a amante e volta à Rússia, onde enfrenta situação pior: repressão, encargos e doenças na família.
A epilepsia e a angústia atacam-no. Nesse período concebe a novela Notas do subterrâneo, livro publicado no Brasil pela Editora Bertrand-Brasil em tradução de Moacir Werneck de Castro, capa de Victor Burton.
Reflexo direto de sua precária condição pessoal, o livro é um mergulho na mente humana, onde o autor vai buscar no pessimismo e na dor material para a obra, da qual transcrevemos alguns fragmentos:
“(...) não somente não mudamos, como simplesmente não podemos fazer coisa alguma. Seguir-se-ia, por exemplo, como resultado de uma consciência apurada, que ninguém se censura por ser um canalha, como se houvesse para o canalha algum consolo no fato de compreender que é realmente um canalha”. (p. 15)
“E agora termino minha vida no meu canto, escarnecendo de mim mesmo com o inútil e despeitado consolo de que um homem inteligente não pode vir a ser nada de sério desde que o só o idiota o consegue. Sim, no século XIX, um homem inteligente deve, está obrigado moralmente a ser, em essência, uma criatura sem caráter.” (p. 11)
Quando preparava para seu editor o livro Crime e castigo
O Cidadão
, torna-se um renovador do jornalismo. Quando publica Os possessos e Os irmãos Karamázovi já era o maior autor russo do momento.
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