12/03/2024

 

JOAQUIM BRANCO: UM AUTOR COM O SELO DA POESIA

José Luís Jobim



Creio que Joaquim Branco não necessita de apresentação para Cataguases, cidade que sabe muito bem a imensa energia e criatividade que há por trás deste poeta, pesquisador e professor, ligado à vida cultural da cidade há meio século. Também não necessita de apresentação no Rio de Janeiro e nos outros lugares do Brasil onde ele ou sua obra circularam e circulam. Assim sendo, vou me concentrar, nestas breves linhas, a falar um pouco do livro que ele agora publica, porque, meu caro leitor, quando se lê um livro, nem sempre se conhece a história por trás de sua feitura.

Este livro começou de fato quando Joaquim Branco, poeta já consagrado, após a aposentadoria, passou a dedicar-se mais intensamente ao magistério universitário, na sua Cataguases – que ele carinhosamente chama de "província", e que guarda com ele uma grande sinergia, pois tem uma tradição literária de conexão com o agora, com o nacional, com o transnacional, e um potencial de catalisar personalidades artísticas criativas que sempre chamou a atenção dos estudiosos da literatura e da cultura, e a colocou numa posição nada provinciana. De fato, se é uma província com o selo da poesia, como diz o título, não é só por sua relação com a chamada "Arte Postal", mas principalmente porque, seguindo a etimologia da palavra selo, Cataguases tem a marca ou o sinal da poesia em sua história cultural. E parte significante disto se deve à geração de Joaquim - e muito especialmente a ele.

Falemos então novamente de Joaquim Branco e do seu livro. Um dia, este poeta-professor, já sessentão, decidiu fazer seu doutorado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro: fez o exame de seleção, passou com brilhantismo e começou a frequentar seus cursos em 2003. Tive então o privilégio de ser escolhido como seu orientador de tese, papel que cumpri mais na forma de diálogo do que na de orientação propriamente dita. Na época, ele pensava em trabalhar algum dos temas literários mais presentes no cardápio dos estudos de pós-graduação, mas, a partir deste nosso diálogo, chegamos à conclusão de que o trabalho mais relevante a ser feito, e que provavelmente apenas ele poderia fazer – a partir de sua perspectiva histórica e pessoal –, seria exatamente enfocar os movimentos artísticos em que ele se inseriu, durante toda uma vida dedicada a criar e a refletir sobre a criação. Ao longo das páginas seguintes, portanto, o leitor verá Joaquim contando sua estória, transformando em narrativa um passado em que ele foi personagem, descrevendo e ao mesmo tempo refletindo sobre ações e eventos, dando uma certa ordem e sentido à sua própria perspectiva sobre o que vivenciou, estabelecendo um padrão de organização na própria configuração de seu tempo, e dos movimentos que testemunhou e de que participou, e ajudando a criar quadros de referência para a compreensão do contexto e dos textos produzidos em sua época. Quem o conhece sabe que ele não fez (nem fará) isto em um estilo caudaloso, pois nada mais distante de Joaquim do que prestar-se ao chavão do literato verboso e cheio de pompa que gerou personagens caricatos na obra de Jorge Amado ou Dias Gomes.

De fato, uma das minhas mais árduas tarefas no diálogo com Joaquim foi fazê-lo abandonar parcialmente seu modo seco e enxuto de trabalhar a palavra, para desenvolver mais a análise tanto do que ele efetivamente produziu ao longo de sua longa carreira quanto das circunstâncias e teorias que presidiram esta produção. Assim, Joaquim nos levará a recuperar sua vivência de geração, de interior mineiro dos anos 60 e de homem que morou e visitou os grandes centros, construindo sua literatura e sua vida em jornais, livros, cartões e impressos, mas sempre pensando no contexto social em que ele e seus textos se inseriram. Se os que o conhecem sabem que, de fato, Joaquim tem muito mais a dizer do que disse neste volume, o próprio lançamento do livro servirá, entre outras coisas, para que estes amigos (incluso eu) aproveitem para cobrar dele que escreva mais e que seja menos egoísta com suas memórias – ou seja, que deixe de guardá-las só para si e as socialize mais. Claro, sabemos que o modo sintético de ser de Joaquim vai oferecer resistência, porém vencê-la é importante. Eu mesmo tive às vezes uma tarefa difícil, pois houve ocasiões em que o nosso diálogo funcionava como uma cobrança minha de que ele explicitasse o que estava implícito em seu argumento, e ele dizia mais ou menos o seguinte: "Mas eu preciso escrever isto mesmo? É tão óbvio!". Eu asseverava que estava óbvio para ele, porque ele possuía a informação, mas não necessariamente para o leitor virtual, que poderia não possuí-la, e ele então concedia em explicitar a "obviedade". Creio que muitos leitores do presente (e muito mais do futuro!) nos agradecerão por isto. De todo modo, o resultado está agora disponível neste volume e com certeza este é um trabalho que já nasceu como referência obrigatória de todos os que, no campo dos estudos literários, se dedicarem a estudar a geração e a obra de Joaquim Branco. Bom proveito, caro leitor!

30-04-2013

José Luís Jobim é Professor dos cursos de graduação e pós-graduação em Letras da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e da Universidade Federal Fluminense.

 

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