Cada vez me conscientizo mais de
que Machado de Assis ‘viu’ como ninguém o Rio de Janeiro de seu tempo. Os
problemas sociais, os políticos – toda a saga urbana de um povo foi retratada
por ele, não escapando nem o teatro que se fazia então.
Não sendo autor de nomeada nesse
gênero, passou a crítico teatral e – pasmem! – a censor oficial não remunerado
do CDB – Conservatório Dramático Brasileiro, exercendo essas funções de 1862 a
1864.
Para se entender isso, é preciso
remontar ao projeto cultural de Machado de Assis – como crítico e cronista –,
que teve três fases distintas: a primeira, considerada nacionalista-romântica,
em que rebateu a penetração de peças estrangeiras no Brasil; a segunda, uma
ação pedagógica em que começa a aceitar a alteridade, especialmente o teatro
francês de qualidade; e a última, de um nacionalismo voltado para o povo, com
suas crônicas maduras em que procurou analisar as mazelas do brasileiro,
visando à busca de uma identidade nacional.
Essas são algumas considerações
que faço inicialmente, a partir da leitura do magnífico ensaio de Eduardo Luz
intitulado O quebra-nozes de Machado de Assis – crítica e nacionalismo,
Edições UFC (Universidade Federal do Ceará), Fortaleza, 243 páginas.
Aqui, acompanhamos o trajeto
machadiano mapeado paulatinamente, não sem mostrar o crescimento e o avanço que
permitiram a ele tornar-se o mais importante escritor do Oitocentos brasileiro.
Naquela fase inicial, o jovem
Machado torcia o nariz para o teatro que vinha de fora, rejeitando a “cozinha
estranha”, e propunha ao governo imperial normas para a valorização da produção
interna. Sua atividade como censor batia nessa tecla e em outras como o
aprimoramento dos textos que lhe chegavam para análise e liberação, e, concomitantemente, buscava meios que pudessem promover o refinamento do
público.
Enquanto isso, “expandia-se e
diversificava-se o público de baixa comédia” (p. 81). Também não se poderia
exigir muito de um país cuja população contava tanto em 1876 quanto em 1900 com
84% de analfabetos, segundo o Censo.
Por outro lado, o governo
imperial vedava, entre outros itens, as peças que se apresentassem “contra a
veneração à Nossa Santa Religião, contra o respeito devido aos Poderes Políticos
da Nação e às Autoridades constituídas, e contra a guarda da moral e decência
pública” (p. 74).
Poderíamos falar bem mais sobre
esse ensaio de Eduardo Luz, feliz edição da Universidade Federal do Ceará, mas
paremos machadeanamente no título. É Machado quem faz, numa crônica de 3 de
abril de 1885, uma relação entre as nozes e as ideias, já que em ambas é
preciso quebrar a “casca” para saber o que têm dentro. Aí reside o segredo da descoberta.
Sempre o velho-novo Machado para
nos mostrar – recorrendo a outra metáfora que não a das nozes – com quantos
paus se faz uma canoa... na vida e na ficção.
(Eduardo Luz, autor do livro em análise)
Um comentário:
Interessante a relação das nozes com os ideiais. Sempre que venho por aqui aprendo algo novo. Obrigada, Joaquim!
ANgela Nair
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