8/06/2012
VIAGEM À BABILÔNIA
Nascida em Worcester, nas imediações de Boston, a menina Elizabeth Bishop (1911-1979) perdeu os pais muito cedo e foi criada pelos avós, que apenas conseguiram remediar seus traços de solidão, pois esta a acompanhou por toda a vida.
Ajudada pelo pecúlio deixado pelo pai, pôde concluir a faculdade, mudando-se depois para Nova York. A vida solitária constantemente a impeliu para as viagens, por isso conheceu o Canadá, França, Itália, Marrocos e muitos outros países.
Com o primeiro livro publicado – Norte e Sul –, Elizabeth recebeu um prêmio literário, logo seguido de muitos outros, numa carreira literária de sucesso, especialmente de crítica.
Em Washington tornou-se consultora de poesia na Biblioteca do Congresso, contudo, nessa época, seus problemas maiores – o álcool e a depressão – quase a levaram ao suicídio.
Foi numa grande viagem em 1951 que esteve em alguns países da América do Sul, tendo se maravilhado com o Brasil, onde residiu por alguns anos ao lado de Lota, a companheira que conheceu aqui.
Em 1967, de volta aos EUA, dedicou-se ao magistério, lecionando em universidades como Harvard, contudo voltava sempre ao Brasil. Em contato com a literatura brasileira verteu para o inglês poemas de João Cabral, Drummond e Vinicius de Moraes.
Morreu em 1979, aos 68 anos, em Boston, e deixou obra valiosa, entre cartas, poemas e textos em prosa.
A poesia de Elizabeth Bishop pertence cronologicamente ao alto modernismo norte-americano, no entanto o grande domínio dos ritmos deu-lhe uma característica variada na composição poética.
Ainda que tenha demonstrado preferência por temas em que os lugares – sua geografia em particular – e o mundo dos animais se sobressaem, Bishop era uma poetisa voltada para o “eu”, às vezes com tendência surrealista e ora com traços de ironia.
A Companhia das Letras publicou "O iceberg imaginário e outros poemas", de Elizabeth Bishop, com seleção, tradução e estudo crítico de Paulo Henriques Britto.
Ali estão seus mais significativos poemas e, especialmente, um – “O ladrão da Babilônia” –, escrito quando de sua estada no Brasil, do qual extraímos o fragmento a seguir, que tem como tema os morros do Rio de Janeiro, onde a pobreza a impressionou sobremaneira:
O LADRÃO DA BABILÔNIA
Nos morros verdes do Rio
há uma mancha a se espalhar: são os pobres que vêm pro Rio
e não têm como voltar.
São milhares, são milhões,
são aves de arribação,
que constroem ninhos frágeis
de madeira e papelão.
Parecem tão leves que um sopro
os faria desabar.
Porém grudam feito líquens,
sempre a se multiplicar.
Pois cada vez mais gente
tem o morro da Macumba,
tem o morro da Galinha,
e o morro da Catacumba;
tem o morro do Querosene,
o Esqueleto, o da Congonha,
tem o morro do Pasmado
e o morro da Babilônia.
[...]
(publicado no jornal Cataguases)
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5 comentários:
A Sra. Bishop é mesmo especial, com seus poemas tão sensíveis e imagéticos. E que bela tradução a do Paulo Henriques Britto, não? Traduzir poemas é uma tarefa dificílima. Eu que traduzo todos os dias, já ha cinco anos, sei bem o quanto é difícil traduzir um texto sem rima, imagina com! Fora a métrica, o ritmo...
Sabia que além de sonhar em escrever muitos e muitos livros, o meu outro sonho é traduzir tantos outros? Pois é, já estou com um pé no caminho, num futuro próximo estarei com os dois fincados na literatura.
Até lá continuarei a aprender com os mestres e a visitar o seu espaço.
Pois é, N.Rodrigues (Nicole?), Bishop é uma grande autora e isso vale muito, tanto para o leitor como para o tradutor.
Parabéns, Joaquim, por seu incansável e meritório trabalho em prol da (boa) literatura. Acho muito interessante esse olhar estrangeiro sobre o Brasil que a Bishop coloca em seus poemas e textos. Abraços e admiração da leitora
Dalila, obrigado pelas palavras, ainda mais vindas de quem admiro tanto. Abrçs., JB
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