O LENHADOR DA FLORESTA
Joaquim Branco
Krung levantou mais cedo que de costume, pegou o machado e rumou para a floresta. Na caminhada lembrou-se de que tivera um pesadelo com o Cedro Central durante toda a noite.
O Cedro era uma árvore gigante cujo tronco desafiava os lenhadores da região. Diziam ser uma árvore de épocas imemoriais, devido ao seu tamanho incomum. Aos olhos que o viram em muitos anos, impressionara a todos.
Mas Krung nunca recuara diante de um obstáculo. Então, olhou para a árvore e, como se medisse cara a cara um contendor, começou o trabalho.
As primeiras machadadas, o tronco aceitou bem. Depois foram tantas e tão fortes que os ouvidos de quem passasse não poderiam distinguir o que era ímpeto do que se tornara cansaço do lenhador. Lascas de madeira passavam rentes ao corpo de Krung, batendo em seu rosto ou cravando-lhe na pele.
Na dificuldade de conseguir algum resultado, Krung foi ficando na floresta. Aos poucos, as fendas que abria na árvore não o animavam mais. Eram feridas que apareciam, porém, cicatrizadas na manhã seguinte.
Ao fim de cada dia de trabalho, encostava o machado, comia alguns frutos pendentes de árvores e dormia. Um sono cheio de folhas secas e ventos, quando muito um barulhento bater de asas desconhecidas.
Finalmente um dia Krung resolveu medir a espessura do magnífico tronco. Arrancou uma boa quantidade de cipó das árvores vizinhas e começou a caminhar em volta do Cedro, envolvendo-o com o cipó.
Nos primeiros três dias ficou apreensivo para chegar ao ponto de onde saíra. Mas a caminhada foi se tornando longa demais. Eram semanas e meses andando em círculo, e naquela altura do seu trabalho Krung acabou esquecendo o que estivera fazendo ali.
Só se lembrava agora de seu nome: Krun ou Krr. E também de outra coisa: de que um dia fora o lenhador número 1 de toda a floresta.
5 comentários:
Sonho/pesadelo kafkiano (A Metamorfose?); nome de sonoridade forte (que lembra até algo alemão mesmo, o "Drang" = Ímpeto, do Sturm und Drang pré-romântico): personalidade forte; a derrubada da árvore se torna uma obsessão ou mesmo uma “utopia” de Krung, que termina por se identificar com a floresta ou o meio e se torna parte dela(e), e quando tenta medi-la (a árvore), vai perdendo a noção de si mesmo, tão entregue ao trabalho; lembra mesmo o trabalho dos “grandes”, que acabam por se esquecer de si mesmos, ante a importância do que fazem. Vide Che Guevara.
Ótimo conto, Joaquim! Adorei!
espero não ter falado asneiras! Abraço!
Oi Joaquim,
Passando e conferindo as novidades. Excelente o conto. Belas fotos / atividades.
Um grande abc,
Ricardo Alfaya
Este conto(O lenhador da floresta), me fez pensar em minha vida. Ando vivendo como Krung,absorto nas horas que passam, o tempo que urge áspero...
As ferpas das minhas obrigações perante o mundo parecem me ferir ralmemente a face. Esqueço às vezes até de mim. Estou prestes a escrever um conto sobre quem realmente somos nesse bonde desgovernado. Breve enviarei.
Seu conto éstá ótimo.Muito, muito bom mesmo caro Joaquim!!
uai, sô joaquim.
surpresa e admiração é o que estou sentindo ao constatar que o senhor também é fera na prosa de ficção.
tem mais?
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