7/05/2012
FICÇÃO INTER'DITA
Não sei como classificar, entre os gêneros literários, o segundo livro do escritor cataguasense (residente em Brasília) Marcelo Benini – O homem interdito (São Paulo: Intermeios, 2012, 84 p.). Só esta constatação já vale como referência favorável, não bastassem as outras que irei acrescentar adiante.
Situado entre a crônica e o conto, entre o real-ficcional e a prosa poética, o texto de Benini, à medida que se lê, vai revelando principalmente um autor que escreve muito bem – não apenas no sentido de correção linguística etc., mas naquele ponto em que o domínio da escritura encontra a criação literária.
Esses fatores me levaram à leitura de suas crônicas (?) uma após outra, e fui até o fim sem perder o embalo.
Não que a leitura corra de maneira macia o tempo todo. Ela guina ora para um lado, ora para outro – como na descrição que Machado de Assis, em Brás Cubas, faz do seu estilo comparado ao andar dos ébrios –, e só no final encontra o que procurava.
São crônicas-contos, em certos momentos, e, em outros, contos-crônicas, ou poemas em prosa.
Por exemplo, no início de “Espírito de Palminha”, Marcelo capta o cotidiano tão poeticamente que esta poderia ser um poema, mais na frente uma crônica, para no final se transformar num conto cujo narrador, à vista de jagunços que vão invadir a cidade, reage assim: “Tchuuuuuuuru! Tchuuuuuuuru! Estamos todos correndo à espera de uma voz suave que nos diga:
– Não precisam correr mais, irmãos. (p. 46)
Em “Cartas de Graciliano Ramos”, encontro a enigmática moça que guarda a sete chaves fabulosas cartas de Graciliano Ramos. Aqui um tema poético busca tornar a narração mais misteriosa e as considerações do narrador sobre o espírito feminino, mais reflexivas. O fecho mantém a secreta chave: “Nunca pude ler as cartas, talvez porque a moça esteja guardando esse segredo para alguém que lhe inspire mais confiança, alguém que não lhe tenha segredos.” (p. 38)
“Raulzito azul” sinaliza o olhar do cronista para a metrópole anônima, engarrafada de pedintes e moradores de rua, e “profetiza” uma revolução desses miseráveis que irão assaltar o poder em substituição aos engravatados de sempre:
“O sinal abriu e percebi que Raulzito vinha descendo a rua recolhendo contribuições para a revolução. Rapidamente peguei todas as moedas que tinha e entreguei-as ao grande líder.” (p. 20)
Enfim, ao procurar um “defeito” no livro, encontrei um, que é também o da maioria das edições atuais: não oferece conforto ao manuseio do leitor, pois as páginas não se abrem fácil e naturalmente, ao contrário dos antigos livros costurados à linha. Essa dificuldade tão geral, porém, não impede o leitor de usufruir do prazer que a boa literatura de Marcelo Benini nos proporciona por meio desse auspicioso e surpreendente lançamento.
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3 comentários:
Que legal, Joaquim!
Seria o Marcelo filho do Aristides, nosso antigo colega no BB?
sim, é ele mesmo. Tem futuro como escritor.
Dispertou a minha curiosidade o tema poético onde a narração misteriosa e as considerações sobre o espírito feminino conta sobre as “Cartas de Graciliano Ramos”, guardadas a sete chaves pela moça. Bem interessante o assunto...
Angela Nair
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